Após Balneário Camboriú, em Santa Catarina, praias das cidades de Matinhos, no litoral sul do Paraná, e de Guarapari, no Espírito Santo, também devem ter suas faixas de areia ampliadas. Porém, mesmo antes de começar, a obra da orla paranaense se tornou alvo de críticas de professores da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

A megaobra catarinense tem gerado polêmicas. No fim de outubro, duas mulheres atolaram em um trecho em obras e precisaram ser resgatadas. Pouco depois, no início deste mês, um homem em situação de rua foi achado dentro de uma tubulação.

Inspirada em Balneário Camboriú, a prefeitura de João Pessoa, na Paraíba, planeja alargar trechos de quatro praias no ano que vem. Já Ilhabela, no litoral de norte paulista, pretende fazer um estudo para preencher faixas de areia.

No município paranaense, a ideia é ampliar a faixa de areia de 80 a 100 metros. Atualmente, em algumas partes, poucos metros separam a terra firme da orla. "Em alguns lugares [em Matinhos] as pessoas têm que se equilibrar nas pedras e em alguns pontos não há mais areia", afirma Everton Souza, diretor-presidente do IAT (Instituto Água e Terra), ligado ao governo estadual, que acompanha o contrato.

O avanço em direção ao mar é superior ao realizado em Balneário Camboriú, que foi de 70 metros da orla -em alguns trechos, chegou a 180 metros, o que resultou em notificação de órgãos ambientais. Procurada, a prefeitura afirmou que a metragem a mais já estava prevista no projeto inicial e que está recorrendo da atuação.

Segundo Souza, só a etapa de alargamento da faixa de praia, que inclui a mobilização, desmobilização e operação da draga, e os equipamentos necessários para espalhar do material, está orçada em R$ 151 milhões -a de Balneário Camboriú custou R$ 66,8 milhões.

A intervenção total em Matinhos deve custar R$ 317 milhões e abrangerá o trecho entre o canal da avenida Paraná, na praia Brava, até o balneário Flórida.

O diretor do IAT diz, porém, que não é possível fazer a "mínima comparação" entre os dois projetos. Na cidade catarinense, as obras basicamente se restringiram à ampliação da faixa de areia.

Além do alargamento, o projeto em Matinhos prevê a construção de espigões, estruturas perpendiculares à praia que avançarão cerca de cem metros mar adentro com a intenção de diminuir a energia das ondas e proteger a areia nova. Também deve ser construído um sistema de galerias de águas da chuva para diminuir os riscos de enchentes.

O projeto prevê ainda a recuperação do canal da avenida Paraná, que desagua no oceano, a revitalização completa da orla -recuperação do passeio, instalação de ciclovias, construção de passarelas, paisagismo com espécies nativas- e a recomposição da restinga.

Antes da apresentação das propostas, o instituto recebeu 63 manifestações de empresas interessadas na obra. Desses, quatro consórcios foram habilitados para participar da licitação.
Atualmente, o processo está na fase final, em que as participantes que não foram escolhidas ainda podem recorrer da decisão. "Até ontem, chegaram recursos. Semana que vem, devem estar todos respondidos. Vamos homologar ainda em novembro", afirma o diretor-presidente do IAT.

A homologação, acrescenta ele, permitiria o início das obras neste mês -a previsão é que sejam concluídas em 32 meses. Outro trecho de 1,7 quilômetro, entre os balneários Flórida e Saint Etienne, também deve passar por revitalização. Nessa segunda etapa, devem ser investidos cerca de R$ 126 milhões, mas, por enquanto, a obra ainda requer licenças ambientais.

Críticas

O projeto é alvo de críticas de professores da UFPR (Universidade Federal do Paraná), que, desde julho do ano passado, já elaboraram quatro notas técnicas, encaminhadas ao governo estadual apontando "inconsistências" em relação às obras.

O professor do departamento de geografia Eduardo Vedor observa que o projeto de alargamento da praia é da década de 1990 e teve o licenciamento ambiental aprovado em 2010. "Na conclusão do EIA (Estudo de Impacto Ambiental), foi apontada uma série de condicionantes, mudanças no desenho da obra, porque o EIA conclui que daquele jeito não dava para construir e isso ficou adormecido por dez anos", afirmou Vedor.

Em 2019, o projeto voltou à tona com propostas que, segundo o professor da UFPR, não foram discutidas anteriormente, como é o caso da "engorda" da praia, como é chamado o alargamento da faixa de areia.

"É um empreendimento fora da agenda de planejamento, que atende exclusivamente interesses da especulação imobiliária. É a reprodução da lógica de (Balneário) Camboriú em Matinhos", diz o docente.

Para Vedor, o licenciamento ambiental está vencido porque o projeto foi alterado de maneira oposta ao que o EIA/RIMA (Relatório de Impacto Ambiental) sugere. Os espigões, acrescenta ele, são estruturas consideradas uma "tecnologia obsoleta" e que podem intensificar a erosão da faixa de areia.

O diretor-presidente do IAT nega que não haja jazida com areia suficiente para a obra. Para ele, Vedor não tem responsabilidade técnica para avaliar a obra e os posicionamentos do geógrafo são isolados, apesar das notas técnicas serem assinadas por outros professores da UFPR.

O diretor-executivo da SPVS (Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental), Clóvis Borges, critica a concentração de um volume grande de investimentos do governo estadual em apenas uma cidade. Segundo ele, enquanto milhões são destinados para o "turismo de guarda-sol" em Matinhos, pouco é investido no turismo de natureza em parques e unidades de conservação no litoral norte.

"O governo continua enxergando o litoral como porto e turismo de guarda-sol. E o potencial econômico e desenvolvimento para a geração de empregos é muito maior se o governo conseguisse enxergar as potencialidades das unidades de conservação caso elas recebam investimentos", diz Clovis.

O prefeito Zé da Ecler (Podemos) afirma que o encurtamento da faixa de areia da praia tem afugentado visitantes nos últimos anos. "Matinhos está totalmente penalizada, porque os turistas não estão vindo mais. Aqui não temos indústrias e temos comércio pobre. Vivemos exclusivamente para o turismo", diz.

Ele afirma acreditar que a obra vai trazer mais renda à cidade. "Precisamos com extrema urgência da obra (de alargamento), estamos passando fome, já chegamos ao pico de 5.000 cestas básicas por mês. Aqui não tem emprego."

Espírito Santo

Em Guarapari, no Espírito Santo, o alargamento ocorrerá na praia de Meaípe. Uma rodovia já foi danificada pelos efeitos do encurtamento da faixa de areia. Está em andamento uma licitação para aumentar a faixa de areia de 20 a 40 metros de largura, em um trecho de 3.300 metros de extensão. As duas empresas que atuam em Balneário Camboriú, a DTA Engenharia e a belga Jan de Nul, encabeçam consórcios diferentes na disputa do contrato.

Inicialmente será feita a recuperação da rodovia, até janeiro, com a colocação de rochas e reconstrução de uma das pistas. Já para a obra de ampliação da praia, ainda falta o licenciamento ambiental, que leva 180 dias para ser expedido.