Infraero esquece que os passageiros também são seus clientes e chancela política de abuso de preços nos serviços básicos

 

Cláudio Magnavita
 
Quem utiliza o serviço aéreo no Brasil devia ser chamado de vítima e não de passageiro. Infelizmente os problemas que afligem o usuário do transporte aéreo estão sendo permanentes. Nem neste caso a palavra “passageiro” pode ser usada.
 
O verdadeiro culpado deste colapso sistêmico tem se mantido oculto. Trata-se do Poder Concedente, leia-se Poder Executivo. Nos últimos anos, assistimos a uma tentativa de transferir para outros personagens uma responsabilidade que é exclusiva da União.
 
O caso mais grave é do sistema aeroportuário nacional. A falta de respeito ao cliente desafia qualquer lógica de bom senso. O usuário, neste caso, nunca foi tratado como cliente. O mesmo ocorre com as companhia aéreas, que, na realidade, são clientes da Infraero, como concessionários de um serviço público. O abuso do poder econômico e a forma como ele é colocado em prática chega a ser abusivo.
 
Querem um exemplo? É só lembrar o último lanche realizado antes de embarcar ou a última vez que estacionou o carro em um aeroporto! Nos dois casos é um verdadeiro assalto à mão armada. Um simples refrigerante e um salgado custam pelo menos o dobro de qualquer lanchonete da cidade. Se o lanche for realizado na área de embarque, quando o passageiro está confinado por questões de segurança, o preço fica ainda mais caro. Estacionar o carro também sai salgado. Não há isonomia com os preços dos estacionamentos praticados na cidade. Muitas vezes o custo de três diárias corresponde ao do bilhete aéreo.
 
Além do preço exorbitante o cliente enfrenta uma maratona para achar uma vaga. No aeroporto Santos Dumont, quem for com seu próprio carro nas manhãs de segunda a quinta gastará mais tempo na fila esperando a liberação de uma vaga, do que voando entre o Rio e São Paulo.
 
No aeroporto de Guarulhos as vagas delimitadas no chão são obras da ficção. Estaciona-se no meio-fio, em jardins e em qualquer brecha. Além de estar sempre superlotado, o caríssimo estacionamento possui uma péssima iluminação, que reflete no fator segurança.
 
Nas salas de embarques, na maioria dos aeroportos, o número de assentos oferecidos é sempre inferior ao de passageiros, ou seja, a sensação de desconforto é total. É só ver o colapso de Viracopos, Guarulhos, Porto Alegre e Brasília nos horários de pico.
 
Em dois aeroportos que estão fora do controle da Infraero, o de Ribeirão Preto e o de Porto Seguro, estes problemas se repetem. O Poder Concedente é totalmente omisso em todos os casos.
 
Quando o passageiro, ou melhor, a “vítima”, paga a taxa de embarque, ele compra um serviço. Quando adquire uma passagem aérea, também compra um serviço aeroportuário que é pago pela companhia aérea e faz parte da composição do custo tarifário. A empresa paga por cada pouso e decolagem, pela pernoite das aeronaves, pelo uso do balcão de check-in, pela esteira de retirada da bagagem e pelo ônibus que leva e traz o passageiro do avião até o terminal. Todos estes custos são exorbitantes e estão entre os maiores do mundo. A exemplo do passageiro, a companhia aérea é cliente do aeroporto. A passagem desta forma não fica mais barata, os serviços oferecidos são péssimos e o alto custo é repassado ao usuário.
 
Nos últimos anos, a ex-presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Solange Vieira, arranjou uma forma de aliviar a responsabilidade do Poder Concedente. Estimulou a briga entre passageiros e companhias aéreas. As empresas tiveram a sua imagem demonizada pela Anac, que imputou responsabilidades sobre problemas que são causados pelo próprio Governo, principalmente na questão da infraestrutura. Os próprios aeroportos não estão preparados para atender às demandas geradas pela legislação que protege o passageiro. Se houver o fechamento do Santos Dumont entre 11h e 15h, como as empresas poderão providenciar almoço para todos os passageiros? Não há restaurante e lanchonete capazes de atender a esta multidão.
 
É preciso acabar com este verdadeiro assalto contra os passageiros nos aeroportos brasileiros, onde se paga nas lanchonetes, nas farmácias, nos estacionamento, entre outros serviços básicos, os maiores preços do mundo. Fazer com que o usuário seja tratado como um elo desta corrente, que inclui também o Poder Concedente e o Concessionário, passou a ser uma das bandeiras da Anpass (Associação Nacional e Assistencial dos Passageiros e Usuários do Transportes Individuais Coletivos, Terrestres, Aéreos e Marítimos).
 
Com assento no Conselho Consultivo da Anac, a Anpass está preocupada que o mesmo desrespeito que pune os passageiros do sistema aeroportuário brasileiro, migre para o modelo de privatização dos aeroportos. O temor é que, a exemplo dos países onde o processo de privatização ocorreu, o passageiro seja punido com o aumento das tarifas aeroportuárias, que inevitavelmente serão repassados para o preço das passagens. Quer também proteger o passageiro dos preços abusivos cobrados pelos serviços básicos.
 
As companhias aéreas precisam rever também o tratamento e o respeito ao cliente, principalmente quando são operadoras majoritárias de determinadas linhas. A questão do conforto a bordo e do atendimento em terra aquele que é a razão do transporte aéreo, são embates que estão na mira da Anpass. O que não pode se ignorar é a existência de uma agenda comum entre os usuários e concessionários da aviação comercial tendo como alvo o Poder Concedente.
 
Para a Anpass, o monopólio da Infraero e a herança de preços praticados nos aeroportos, oriundos de uma época em que o transporte aéreo era privilégio de uma elite endinheirada, não condiz com a massificação ocorrida nos últimos anos e com a chegada das classes C e D.
 
O atual ministro da Aviação Civil, Wagner Bittencourt de Oliveira e o presidente da Infraero, Gustavo Vale estão sendo omissos neste diálogo com o passageiros. Fato que deverá ser minimizado pelo novo presidente da Anac, Marcelo Guaranys, que sempre compreendeu que todo o sistema oficial necessita ter a defesa do usuário do sistema aéreo como objetivo maior.